O século XVII e a Restauração

No reinado de D. Filipe III de Portugal, a partir de 1621, a conjuntura de crise ia-se agravando. O governo do conde-duque de Olivares, que recrutava portugueses para guerras que se travavam bem longe e que ao mesmo tempo exercia uma pressão fiscal sobre o país para obter financiamento para essas guerras, tinha descontentamento dos populares e da aristocracia.

A revolta de Évora de 1637 foi um prenúncio para o que viria a acontecer e a aceitação do Duque de Bragança em ser o futuro rei foi o passo seguinte para o desenrolar dos acontecimentos. A revolta da Catalunha contra o projecto de uniformização política espanhol em 1640 precipitou a revolta portuguesa. A obrigatoriedade de participação da nobreza portuguesa em rebelar os catalães levou a que os fidalgos portugueses pedissem ao Duque de Bragança para os “libertar”. O futuro D. João IV aceitou.

Com a revolução do 1º de Dezembro de 1640, os elvenses cansados de estar sob o jugo espanhol, aclamam D. João IV logo no dia 3.

Com a aclamação de D. João IV como Rei de Portugal à revelia do inimigo, era agora hora de organizar o país para a guerra.

O Conselho de Guerra é a primeira instituição bélica, criado a 11 de Dezembro de 1640, tendo como missão elaborar pareceres sobre a guerra para o rei. De seguida são criados os Governos de Armas das diversas províncias e a Junta dos Três Estados, composta por Clero, Nobreza e Povo e destinada a superintender a cobrança dos tributos para a guerra. Finamente, as Vedorias e Pagadorias fariam a criação e manutenção dos registos e dos pagamentos. Entender todos estes preparativos para a guerra que se avizinhava é necessário para entender o período que iria mudar a cidade de Elvas para sempre.

D. João IV percebe claramente que o principal teatro de guerra será o Alentejo, por ser a forma mais rápida de chegar a Lisboa, e que Elvas se já era entendida desde a Idade Média como localização estratégica, passa agora a ser fulcral para a manutenção da independência. A importante cidade de fronteira seria a capital da guerra do Alentejo e teria que ser transformada na maior cidade fortaleza alguma vez vista com novas fortificações, imensos quartéis e vários edifícios militares: o Hospital Militar e Convento de São João de Deus, o Conselho de Guerra, seis paióis, a Cisterna, a Vedoria, a Contadoria e a Pagadoria, o Assento, o Arsenal Real, o Forte de Santa Luzia e ainda uma Escola de Fortificação criada em 1652 por D. Teodósio.

Para além de todas estas construções da Restauração, o urbanismo da cidade de Elvas foi remexido. Imagine-se o fervor construtivo de todos estes edifícios que vimos numa cidade então com cerca de 12.000 habitantes. Começando junto ao Convento de São Domingos, foi demolido um hospital que este tinha anexo para a construção da muralha. Com esta última foi feita uma estrada de armas que possibilitava o transporte de armamento e militares desde a antiga Porta de Badajoz até às Portas de Olivença e depois até ao Hospital Militar. Ligado a esta estrada de armas estava o Assento para que facilmente os géneros chegassem onde mais eram necessárias. Continuando no sentido dos ponteiros do relógio a estrada de armas seguia para a Cisterna, subindo depois para os Quartéis das Balas ou de Artilharia e para as Portas da Esquina. Nas Portas da Esquina para além do paiol da muralha estava o Paiol da Conceição, donde partia outra estrada de armas que o ligava ao Castelo e ao outro Paiol, o de Santa Bárbara. Nesta estrada, hoje constituída pela Avenida 14 de Janeiro, pela Rua dos Quartéis e pela Parada do Castelo, estava a maioria dos quartéis, o Conselho de Guerra e no século seguinte seriam aí construídos o Quartel do Trem e a Casa das Barcas. Continuando a viagem de regresso a São Domingos, na zona mais íngreme não existe estrada de armas mas é lá que estão a casa do Governador da Praça, bem como os Quartéis da Corujeira.

Para além disto, como vimos ergueu-se o Forte de Santa Luzia e recuperaram-se as atalaias em volta da cidade. Tudo estava preparado para impedir a entrada do inimigo com uma fortaleza verdadeiramente inexpugnável.

As primeiras provas de fogo deram-se logo na década de 1640 mas é a partir de 1657 que a guerra se torna mais efectiva. Em 1658, em resposta a uma ofensiva sobre Badajoz chega uma ofensiva espanhola sobre Elvas, a praça-forte de Portugal e considerada por todos a chave do reino. Não bastaria não ter conquistado Badajoz e ter ficado com avultadas baixas, agora o exército português ver-se-ia em mãos com um cerco que caso tivesse sucesso por parte do inimigo este marcharia sobre Lisboa.

Aproximava-se um dia que ficaria na história de Elvas e na história do país: o 14 de Janeiro de 1659, hoje o feriado municipal da cidade.

A situação era agora muito perigosa. O exército de D. Luís de Haro com 12000 infantes e 3500 cavaleiros riposta e cerca a cidade de Elvas com cerca de 20000 homens e vinte bocas de fogo, no entanto a vitória sorriu aos portugueses numa manhã de nevoeiro. No local do triunfo ergueu-se o Padrão da Batalha das Linhas de Elvas.

A seguir à Guerra da Restauração e até ao final do séc. XVII viveu-se um clima de paz na cidade de Elvas. No entanto, a cidade não mais seria a mesma. Considerada como a chave do reino, era agora a cidade militar portuguesa por excelência, uma das maiores e mais importantes do país com os seus representantes nas Cortes a serem colocados no banco da frente.

Seguiu-se ainda assim um período de crise por todo o país. A guerra havia esgotado os cofres estatais e por isso é também um período de pouco fervor construtivo. Algumas excepções: a Capela de Nossa Senhora da Conceição, o Colégio Jesuíta e o Convento de São Paulo.